Quiet Quitting: como as empresas podem lidar com a ‘demissão silenciosa’
Por Júnior Moreira Bordalo Tema virou debate nas redes sociais e questiona o comportamento de ‘vestir a camisa’ sem o devido reconhecimento em prol da qualidade de vida e preservação da saúde mental Nos últimos dias, o brasileiro passou a lidar com mais um termo em inglês decorrente das atualizações das relações no mercado de trabalho: quiet quitting. A tradução literal é “demissão silenciosa”, mas, na prática, visa refletir sobre a postura de profissionais que refutam “vestir a camisa” sem o devido reconhecimento em prol da qualidade de vida e preservação da saúde mental. A ideia é fazer apenas o que foi acordado no momento da contratação. Parece simples, mas o tema virou debate nas redes sociais, com questionamentos a respeito das possíveis posturas que as empresas poderiam adotar diante das reclamações de esgotamento e exploração, potencializadas no contexto pós-pandemia da covid-19. Surgido nos Estados Unidos, quiet quitting é uma atualização de quitting-in-place (desistir sem sair do lugar). O movimento ganhou força no TikTok, onde a hashtag acumula mais de 75,9 milhões de visualizações. Trata-se basicamente da tentativa de redefinir as relações de trabalho, derrubando a cultura da alta performance. “É sobre impor limites e priorizar a sua saúde; é pensar a vida para além da profissão. A gente não vive só para gerar rendimento e ter consciência de classe é fundamental”, resume a gerente de projetos, Bianca Rati, de 26 anos, adepta da ideia. Impulsionada pelas gerações Z e Millenials, a tendência chegou em meio à chamada grande renúncia (Great Resignation) – ação do país americano iniciada com jovens compartilhando a saída dos empregos nas redes sociais. Só em março deste ano, 4,5 milhões de trabalhadores pediram demissão, segundo dados do Departamento do Trabalho. Aqui, a tradução gerou estranhamento e críticas. “‘Mas a pessoa está fazendo corpo mole para ser demitida e receber o FGTS’. Não faz nem sentido este comentário porque é um termo que vem da indústria do trabalho dos EUA, né? E lá eles não têm FGTS”, prossegue a curitibana. Nota-se nos adeptos que, com o home office no período pandêmico, houve um despertar pela busca por mais qualidade de vida profissional e familiar, especialmente no que diz respeito à saúde mental. “Essa valorização do ‘trabalhe enquanto eles dormem’ é adoecedora. A covid nos mostrou o quanto isso não vale a pena. Na hora da crise econômica, muitas pessoas foram demitidas sem a menor consideração. É um sistema que te pede para dar 110%, porém, se faz isso, não sobra nada para você, sua família e amigos”, reflete Bianca Rati. Criador da página Startup da Real – iniciativa que desde 2017 debate os bastidores do empreendedorismo -, Alberto Brandão, de 37 anos, também concorda que a pressão das empresas para que os funcionários gerem resultados, muitas vezes, não é proporcional ao reconhecimento. “É claro que em certos momentos, todo mundo vai precisar ficar até tarde, resolver alguma pendência. É completamente tranquilo e compreensível. O que não dá é para você fazer três horas extras todos os dias”, pondera ele. Para Brandão, a ideia não é prejudicar as empresas, mas sim estabelecer limites claros onde uma “coisa começa e termina”. Confira alguns outros recados de brasileiros sobre quiet quitting no Twitter: Mercado brasileiro Buscando entender os anseios dos trabalhadores no cenário pós-pandemia, em que questões até então minorizadas ganharam destaques, a pesquisa Randstad Workmonitor, divulgada em abril de 2022, pela Randstad — empresa fundada em 1960 para trazer soluções e consultorias em recursos humanos — ouviu 35 mil profissionais. A coleta de informações aconteceu em 34 países com pessoas entre 18 e 67 anos. Para os brasileiros, um ponto importante é flexibilidade. Enquanto ter mais liberdade em termos de localização é fundamental para 71% dos funcionários em nível global, no Brasil o índice é de 85%. Nessa linha, o equilíbrio entre vida pessoal e profissional representou para 97% o aspecto fundamental na hora de decidir pela permanência ou mudança de trabalho — contra 94% do global. Além disso, 41% dos profissionais no Brasil (versus 34% global) afirmaram que sairiam de um emprego que impactasse sua rotina diária. Ou seja, o pensamento sobre quiet quitting já está presente na postura de muitas pessoas. “A verdade é que as empresas não estão sendo pegas de surpresa; já estavam observando esse pico de desemprego. É uma reclamação constante da população mais qualificada; daqueles que têm ensino superior”, afirma Diogo Forghieri, diretor de Talent Solutions da Randstad Brasil. Levantamento da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, com dados do Caged, mostrou que entre janeiro e maio deste ano, 2,9 milhões brasileiros pediram para deixar o serviço, maior número da série história iniciada em 2005. “Será cada vez mais difícil atrair talentos da nova geração com esse formato de exaustão mantido pelas companhias”, destaca ele. Para o executivo, as organizações precisam reescrever as regras do mercado, entendendo que os valores pessoais dos funcionários são pontos importantes e não “uma onda passageira”. “É necessário sentar e ouvir os incômodos. Não tentar adivinhar, nem reprimir. Criação de grupos de afinidades também são importantes”, reforça. Além disso, jornada reduzida, semana de quatro dias, horários flexíveis e sistema híbrido seriam alguns pontos a serem observados para impactar cada vez mais o bem-estar da família e não só do indivíduo. Já a líder de Recursos Humanos da Sólides, empresa de RH PMEs e gestão de pessoas, Távira Magalhães, defende que a precaução como mecanismo para evitar o quiet quitting. “As companhias devem entender o perfil comportamental dos seus funcionários, observando as atividades que realizam hoje. Isso evitaria o esgotamento.” Contudo, para tratar a consequência, ela aposta na conversa “clara e transparente”, em que o cenário de segurança psicológica esteja posto. “É o grande desafio. Cabe ao colaborador entender quais são seus desejos e expectativas, e ao empregador buscar oferecer condições justas para executarem as funções com mais desempenho e sem desgastes, além de um espaço confiável para poderem falar abertamente sobre o assunto.” https://www.estadao.com.br/economia/sua-carreira/quiet-quitting-como-as-empresas-podem-lidar-com-a-demissao-silenciosa/
Entenda o que mudou no vale-refeição e os impactos para trabalhadores e empresas
Decreto e nova lei trazem alterações para as duas modalidades de concessão dos benefícios Por Valor — São Paulo A legislação que trata do vale-refeição e do alimentação foi significativamente alterada. No fim de 2021, o Decreto nº 10.854 mudou as regras do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT). E mais recentemente, a Medida Provisória nº 1.108/2022, convertida na Lei nº 14.442/2022, alterou a Lei do PAT (nº 6.321/1976) para, de forma objetiva, estender a maior parte das novidades do PAT para a modalidade CLT — as duas formas de concessão dos benefícios. Entenda nesse perguntas e respostas elaborado pelo advogado Caio Taniguchi, do TozziniFreire Advogados, as diferenças entre essas formas de concessão do benefício e as principais mudanças: 1 – Quais são as formas de concessão do benefício de alimentação e refeição aos trabalhadores e as suas diferenças? O benefício pode ser concedidos de duas formas pelas empresas aos seus trabalhadores: a) Programa de Alimentação ao Trabalhador (PAT) – Lei nº 6.321/1976; e b) Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – artigo 457, parágrafo 2º, da CLT. A principal diferença entre essas modalidades está no benefício fiscal aplicável às empresas que apuram os seus tributos com base no chamado “lucro real”. Isso porque, apesar das despesas incorridas pela empresa no âmbito do PAT e da CLT, quando comprovadamente destinadas ao custeio de alimentos e refeições, não sofrerem a incidência de encargos trabalhistas e tributos, as empresas que aderem ao PAT têm o direito de deduzir até o dobro das suas despesas na apuração do lucro real (utilizado no cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica – IRPJ). 2 – Quais são as novidades? Obrigatoriedade de que o valor do benefício seja igual para todos os trabalhadores;Possibilidade de que uma única instituição de pagamento faça a gestão de diversos benefícios concedidos pela empresa (alimentação e refeição, mobilidade e home office), desde que o benefício de alimentação-refeição esteja escriturado de forma segregada dos demais;Obrigatoriedade de que o saldo de cartão alimentação-refeição seja utilizado exclusivamente em estabelecimentos que comercializem alimentos e refeições;Vedação de saque ou transferência dos valores aportados no cartão alimentação-refeição;Em caso de rescisão do contrato de trabalho, o saldo do cartão é de titularidade do trabalhador, sem prejuízo da empresa efetuar o desconto dos valores por ocasião do pagamento das verbas rescisórias;Vedação da concessão de vantagens comerciais (desconto/deságio/rebate e prazo para pagamento) pelas empresas que fazem a gestão dos cartões alimentação-refeição;Implementação da portabilidade dos saldos (o trabalhador poderá migrar o saldo do cartão “X” para o cartão “Y”, a seu critério);Implementação da interoperabilidade dos cartões alimentação-refeição (os cartões deverão ser aceitos em todos os estabelecimentos que comercializam alimentos e refeições);Imposição de limite para a dedução das despesas na apuração do IRPJ. 3 – O que motivou essas significativas alterações? O governo federal, por intermédio do Ministério do Trabalho, constatou que a legislação estava desatualizada e, além de não tornar o trabalhador o foco das ações, o benefício era facilmente desvirtuado (saques em dinheiro, compra de produtos distintos de alimentos e refeições). 4 – Quais são as oportunidades esperadas? As medidas tendem a aumentar a concorrência, especialmente por conta da chegada de novos players da área da https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg nesse mercado. Está na “moda” a contratação de “benefícios flexíveis”, que permite ao trabalhador escolher, dentre uma cesta de benefícios oferecidos pela empresa, aqueles que mais se amoldam às suas necessidades. Para isso, a legislação exige que os saldos de cada modalidade de benefícios tenha sua origem e utilização controlados e comprovados, sob pena de serem considerados como o pagamento de remuneração disfarçado (o que poder gerar discussões nas esferas trabalhista e fiscal). Além disso, a proibição da concessão de vantagens comerciais às empresas que contratam o cartão alimentação-refeição está promovendo ótimos debates e ideias a respeito da possibilidade de concessão de benefícios diretamente aos trabalhadores. 5 – Quais são as dificuldades esperadas? Algumas novidades ainda demandam uma regulamentação complementar, para que seja possível implementar o que está previsto na norma. Atualmente, os maiores debates giram em torno da portabilidade e da interoperabilidade, já que são medidas que podem onerar o sistema. Ademais, já existem algumas ações judiciais que discutem a legalidade das alterações (especialmente a imposição de limite para a dedução das despesas na apuração do IRPJ), bem como o descumprimento da legislação por algumas empresas do mercado. Mas, como o Brasil é um país culturalmente propenso ao litígio, já era esperado. 6 – O tema ainda pode sofrer mais alterações? Não teremos uma reviravolta na regulamentação do benefício alimentação-refeição, mas certamente haverá muito debate na edição das normas complementares para detalhar a portabilidade e a interoperabilidade. https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2022/09/10/entenda-o-que-mudou-no-vale-refeicao-e-os-impactos-para-trabalhadores-e-empresas.ghtml
Países apostam em modelo intermediário para contrato de trabalho
Estudo da FGV analisa ações no Reino Unido, Espanha e EUA; para pesquisadora, falta mais enfoque na seguridade social Regulamentar as relações de trabalho por aplicativos é um desafio mundial. Na tentativa de garantir tanto proteção social aos trabalhadores como segurança jurídica às empresas, alguns países vêm criando categorias jurídicas intermediárias entre empregados e autônomos – que, no entanto, estão longe de encerrar os embates em torno da questão. Na Califórnia, uma lei aprovada em 2021 designou motoristas e entregadores de aplicativo como independent contractors, que seriam autônomos com alguns benefícios, como seguro contra acidentes e valor mínimo proporcional ao tempo trabalhado. Depois, a lei foi declarada inconstitucional e até hoje é alvo de apelações e debates na Justiça. Já no Reino Unido, no mesmo ano, uma ação movida contra o Uber foi parar na Suprema Corte. A decisão classificou os motoristas como workers, também uma categoria intermediária, o que permitiu aos trabalhadores usufruir de benefícios como salário mínimo por hora, férias e intervalos para descanso. A Suprema Corte concluiu que havia elementos que indicavam a subordinação dos motoristas ao Uber suficientes para caracterizar relação de trabalho, afastando a hipótese de uma relação apenas civil ou comercial. Na Espanha, foi aprovada a lei Rider, restrita a entregadores. Ela estabelece a presunção de vínculo empregatício e impõe a obrigação de a empresa fornecer informações sobre algoritmos que operem no gerenciamento do trabalho. Jurisprudência “Na literatura internacional, temos tentativas e modelos, mas ainda com muito vaivém; tentam uma coisa e depois voltam atrás. Ninguém conseguiu resolver esse problema a contento”, avalia o economista José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações de Trabalho da Fecomercio/SP. “Tanto que, no mundo inteiro, uma grande parte da regulação está sendo feita através de jurisprudência, das sentenças dos juízes.” Responsável pelo estudo, a pesquisadora da FGV Olívia Pasqualeto avalia que ainda é preciso avançar na questão previdenciária. “Nos casos analisados, fica mais evidente a preocupação em decidir qual é a natureza jurídica da relação entre trabalhador e plataforma do que a questão da seguridade social, como a Previdência, que é algo importante”, diz. Ainda na tentativa de tirar lições da experiência internacional, ela destaca a necessidade de olhar para além dos motoristas e entregadores. ”Há muitas outras atividades intermediadas por plataformas: serviços domésticos, de beleza, entretenimento”, diz. “Se a gente quer regular de forma mais duradoura esse tema, é preciso olhar também para esses outros trabalhadores.” https://www.estadao.com.br/economia/paises-apostam-em-modelo-intermediario-para-contrato-de-trabalho/
Trabalhadores estão sem proteção e sociedade não aguenta mais ver isso, diz José Pastore
Por Anna Carolina Papp BRASÍLIA – Diante da informalidade recorde no País, o próximo governo não vai conseguir escapar da discussão acerca da regulamentação do trabalho mediado por aplicativos, avalia o economista José Pastore, professor da FEA-USP e presidente do Conselho de Emprego e Relações de Trabalho da FecomercioSP. “A sociedade brasileira não está mais aceitando ver essa garotada em cima de uma motocicleta, se estatelando num poste sem ninguém para responder por eles, sem ninguém ser responsável. A sociedade não aguenta mais ver isso, é desumano”, diz. O desafio, afirma Pastore, é oferecer proteção social a esses brasileiros sem minar o caráter dinâmico e heterogêneo desse tipo de trabalho. Entre as várias alternativas possíveis, ele defende como promissor tornar esses trabalhadores contribuintes individuais do INSS, com algum tipo de contrapartida por parte das plataformas. A seguir, os principais trechos da entrevista. Como o sr. avalia a retomada do mercado de trabalho? É sustentável? Os dados do mercado de trabalho estão mostrando uma dinâmica bastante vigorosa. Está se recuperando tanto o emprego informal quanto o formal; embora, infelizmente, o informal esteja crescendo mais do que o formal. Mas houve uma recuperação razoável do formal: no primeiro semestre, foram mais de um milhão e meio de postos de trabalho formais que foram criados. Não esperava que viesse com essa força. Analisando os dados, a gente entende por quê: a retomada de comércio e serviços. A injeção de vários auxílios, antecipação de 13º salário, resgate de FGTS… isso também ajudou nessa recuperação. No segundo semestre, o Auxílio Brasil, auxílio-caminhoneiro e taxista vão continuar a dar impulso para comércio e serviços, o que deve ajudar o mercado de trabalho a ter um avanço positivo, tanto o formal como o informal. É capaz de a gente terminar o ano com talvez 8,5% de taxa de desemprego e gerar cerca de 2,2 milhões de trabalho formal, o que é um desempenho bastante razoável. Mas e para o ano que vem? O ano que vem é uma incógnita. Se esses auxílios de fato pararem ou diminuírem, você vai ter um banho de água fria no mercado de trabalho; não vai crescer tanto quanto cresceu esse ano. Outra coisa: se a inflação voltar — porque ela está sendo bastante contida, pela redução de impostos dos combustíveis –, também vai atrapalhar o mercado de trabalho, porque, com inflação alta, investe-se menos. Investindo menos, você gera menos emprego. Então, vai ser uma preocupação. O cenário para 2023 não está tão tranquilo assim como a gente está vendo em 2022. Como essa retomada poderia ser mais sustentável? O Brasil, para dar uma arrancada boa em matéria de emprego, teria de crescer mais do que o previsto. Já estão falando em 2% para este ano. É melhor do que se pensava no início do ano. Mas, para a gente ter um arranque bom de emprego, a gente precisaria passar para a casa dos 3,5%, 4% de crescimento do PIB. Além disso, a gente precisaria ter a retomada de investimentos pesados em infraestrutura. O investimento em infraestrutura envolve cadeias produtivas muito longas e gera muito emprego direto, indireto e remoto. O que está muito preocupante é que o governo está sem capacidade de investimento pesado na infraestrutura. Uma usina elétrica, por exemplo: o setor privado sozinho não consegue fazer isso aí; ou uma ferrovia… A gente não está vendo perspectiva para o ano que vem da volta de investimentos pesados em infraestrutura. Eu vejo 2023 com muita preocupação. Se a inflação acelerar e os investimentos ficarem muito tímidos, eu acho que podemos ter um aumento do desemprego. Agora, se a inflação for contida e você de alguma maneira readquirir uma confiança na economia brasileira e tiver um mínimo de equilíbrio fiscal para permitir aos governos municipal, estadual e federal investir em infraestrutura – que é tão necessário, porque ela está corroída, muito gasta e com fadiga em todas as áreas –, acho que o setor privado complementa o resto e a gente pode ter uma situação de emprego favorável. Mas, estou mais pendente para o primeiro cenário do que para o segundo no ano que vem. Diante da alta informalidade hoje no País, o sr. vem se debruçando sobre essa questão dos trabalhadores mediados por aplicativos e plataformas digitais. Como avalia o cenário que temos hoje? Quando a gente fala em plataforma, a gente sempre tem na cabeça transporte individual e entrega, que são as coisas mais visíveis; mas há centenas de atividades, das mais diversas possíveis. Tem plataforma de cabeleireiro, de pedreiro, de pintor, de designer, até de goleiro. É uma heterogeneidade fantástica. Cada um trabalha de um jeito: um trabalha duas horas por dia, outro trabalha oito; um trabalha uma vez por semana, outro, todos os dias. Um trabalha um pouquinho de tempo e volta a fazer uma atividade mais convencional de emprego. O trabalho é descontínuo no tempo e no espaço, uma diversidade de regimes de trabalho fantástica. E o desafio é esse: como você consegue proteger essas pessoas? Porque, hoje, esses trabalhadores estão sem proteção nenhuma, praticamente. Uma ou outra plataforma tomou a iniciativa de fazer um seguro acidente ou de dar alguma coisa na área de saúde ou um vale-refeição; mas, são poucas. O grosso não tem proteção nenhuma. Eu acho que a sociedade brasileira não está mais aceitando ver essa garotada em cima de uma motocicleta, se estatelando num poste sem ninguém para responder por eles, sem ninguém responsável. A sociedade não aguenta ver isso mais, é desumano. Então, é urgente a gente buscar uma forma de começar a dar proteção para essas pessoas, e aí é que está o debate. Quais são as alternativas? Uma delas é tentar enquadrar essas pessoas na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o que eu, pessoalmente, acho muito difícil. Como você estabelece um contrato celetista com um sujeito que trabalha de uma maneira tão irregular, se a característica básica do emprego celetista é continuidade, assiduidade, habitualidade, assalariamento, subordinação? Esse tipo de trabalho é de uma irregularidade infinita, não dá para encaixar. Muitas vezes, é
Regulamentação de empregos por aplicativo está nos planos dos candidatos à Presidência
Por Anna Carolina Papp Entregadores e motoristas de plataformas digitais não têm cobertura previdenciária; quadro de informalidade ficou mais evidente com pandemia O quadro de informalidade e fragilidade de entregadores e motoristas de aplicativo, que ficou ainda mais evidente na pandemia, gerou uma onda de propostas no Congresso na tentativa de oferecer alguma proteção social a esses trabalhadores. O assunto não fugiu do radar dos principais candidatos à Presidência, que defendem algum tipo de regulamentação da atividade. Em seu programa de governo, o presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição, diz que a “estratégia de inclusão e combate à informalidade deverá contemplar alternativas contratuais inteligentes, (…) incluindo trabalhadores por aplicativo”. Em abril, o Ministério do Trabalho e Previdência anunciou que o governo pretendia regulamentar esse tipo de trabalho ainda neste ano, numa modalidade própria, distinta da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), mas com recolhimento de contribuição previdenciária. “Eu queria, até o final de 2022, deixar isso desenhado, mas a gente não pode ter pressa. Tem de ter tranquilidade para que a gente desenhe uma política que faça essa entrega para a sociedade brasileira”, diz o ministro do Trabalho e Previdência, José Carlos Oliveira. “Alguns países fizeram isso de forma abrupta e acabou não dando certo. Não vamos cometer o mesmo erro.” Lula (PT), que lidera as pesquisas de intenção de voto, diz em seu programa que o governo vai propor uma nova legislação trabalhista, com “especial atenção” a trabalhadores “mediados por aplicativos e plataformas”. Procurada, a campanha do candidato não detalhou a proposta para essa categoria. Ciro Gomes (PDT) defende a regulamentação do setor no seu programa, “estabelecendo patamares de higiene, segurança e de ganhos compatíveis com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana”. A campanha do candidato propõe uma legislação que contemple tanto os trabalhadores que enxergam a atividade como um complemento salarial como os que gostariam de estabelecer vínculo formal. Continua após a publicidade “Precisamos prever as duas possibilidades para que o trabalhador opte, individualmente, pela que preferir: vínculo normal de trabalho, com carteira assinada nos moldes atuais, ou uma forma de registro que viabilize uma atuação flexível”, afirma Nelson Marconi, coordenador do plano de governo. “Esse vínculo mais flexível deve prever a contribuição ao INSS e a um seguro saúde e contra acidentes, incluindo a possibilidade de afastamento temporário.” Sem vínculos trabalhistas Embora não mencione expressamente os trabalhadores de aplicativo em seu programa de governo, a campanha de Simone Tebet (MDB) afirma que eles serão amparados pela criação do programa Poupança Seguro Família, uma espécie de FGTS para informais. “O governo irá reservar 15% da renda declarada desses trabalhadores para constituir uma poupança, na qual eles poderão sacar recursos até duas vezes por ano em momentos de queda de renda”, diz a campanha. Vice-presidente da Associação dos Motoristas de Aplicativo de São Paulo, Raniel de Queiroz diz que a associação defende uma regulamentação de âmbito federal que mantenha a liberdade que os motoristas têm hoje. “Nós não queremos vínculos trabalhistas, porque eles engessam o trabalho. Já o MEI é uma alternativa mais viável e traz benefícios, como a questão da previdência.” Já Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) afirma que as plataformas associadas “apoiam a inclusão dos trabalhadores de plataforma de mobilidade urbana no sistema oficial de Previdência Social” e “defendem como premissa que o debate considere a dinâmica das novas relações de trabalho”, em que motoristas e entregadores são “profissionais independentes”. https://www.estadao.com.br/economia/regulamentacao-de-empregos-por-aplicativo-estao-nos-planos-dos-candidatos-a-presidencia/