Reformas, contrarreformas e não reformas

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A destruição do arcabouço fiscal, construído a duras penas, terá graves e duradoras consequências Economistas do governo apontam, com razão, o grande número de reformas implantadas nos últimos três anos e meio, que terão um impacto positivo permanente sobre a taxa de crescimento da economia. Entretanto, contrapondo-se a elas, houve várias “contrarreformas” e retrocessos institucionais com efeitos na direção contrária. Além disso, há muitas “não reformas”, aquelas prometidas no início do governo que não saíram do papel. Só se conhecerá o resultado final no futuro, mas não há razões para otimismo. A teoria econômica ensina que distorções, principalmente microeconômicas, afetam negativamente a alocação de recursos, os investimentos e, consequentemente, o crescimento e a renda de longo prazo. Ao canalizar fundos para firmas e empresas pouco produtivas, e dificultar a operação de outras mais eficientes, concentrando desproporcionalmente recursos nas “piores” empresas e agentes econômicos, as distorções reduzem o produto agregado. Má regulação, barreiras comerciais, tributação cumulativa, subsídios mal direcionados são exemplos de distorções que prejudicam o funcionamento dos mercados, desincentivam o investimento e a entrada de novas firmas mais eficientes. Uma parte do governo possuía o diagnóstico correto de que essas distorções precisavam ser reduzidas. Assim, várias importantes reformas foram implementadas: novos marcos legais do saneamento, das ferrovias e do gás, Lei de Liberdade Econômica, nova lei de licitações, PIX, entre outras. Além disso, foi aprovada a independência formal do Banco Central, com conhecidas e positivas repercussões sobre a política monetária, bem como a reforma de Previdência, embora aqui grande parte do mérito tenha sido do Congresso, dada a resistência do governo ao projeto aprovado. A destruição do arcabouço fiscal construído a duras penas terá graves e duradoras consequências Não há dúvidas de que todas essas medidas terão impactos positivos sobre a economia. Em setores como o saneamento, já há sinais de aumento dos investimentos. Entretanto, ao mesmo tempo que se avançou nessa direção, observaram-se retrocessos significativos em outras. O exemplo mais recente é a PEC Eleitoreira, ou PEC Kamikaze. Ela contorna a lei eleitoral, a Lei de Responsabilidade Fiscal, e o Teto de Gastos, o que trará um enorme custo reputacional ao país, com profundas consequências de longo prazo. Antes dela, a PEC dos Precatórios já desrespeitara o teto dos gastos, uma medida de 2016 que viabilizou um ajuste fiscal gradual. O teto não diminuiu gastos, apenas prometeu que eles parariam de crescer. Com a elevada credibilidade proporcionada por uma emenda constitucional, cuja alteração exigiria a difícil maioria de 60% dos votos nas duas casas legislativas, os mercados acreditaram no teto de gastos, o que levou a uma imediata e significativa queda da taxa de juros. E isso sem que tivesse ocorrido qualquer queda de despesas, somente congelamento de seu valor real. De agora em diante, entretanto, após as recentes medidas casuísticas que mostraram ser mais fácil emendar a Constituição do que alterar uma convenção de condomínio, não se poderá mais anunciar ajustes fiscais graduais somente no futuro. Os mercados se tornarão São Tomé: precisarão ver para então crer. O impacto sobre os juros já se fez sentir, com aumentos acentuados das taxas mais longas. Um segundo exemplo de grave recuo institucional é o chamado orçamento secreto, que solapa um dos pilares das democracias, a execução orçamentária. Embora tenha sido uma “obra” do Legislativo, o Executivo foi conivente e apoiou a medida como troca política. O efeito final é sobre os gastos públicos, sua alocação e impacto na economia. Beneficiaram-se grupos de interesse particulares em detrimento da sociedade como um todo. Também a interferência na Petrobras foi um retrocesso, pois mostrou os limites da Lei das Estatais – um grande avanço na governança -, o que deverá afetar o desempenho de todo o setor de petróleo e gás. A manipulação de preço e a pressão sobre a empresa jogaram por terra o projeto – acordado com o Cade – de venda de refinarias. Quem investirá numa firma cujo produto tem seu preço dependente do humor do presidente? Perde-se assim uma oportunidade única de modernizar o setor. A lista de recuos é grande. Quanto às “não reformas”, as mais relevantes seriam a reforma tributária, a reforma administrativa, a abertura comercial e as privatizações. Estas últimas foram prometidas no campo dos trilhões, mas ficou muito longe disso. A única importante, Eletrobras, trouxe de contra-preso o jabuti da extensão da rede de gás à Amazônia que trará pesados custos à sociedade – e lucros a alguns grupos de interesse organizados -, além de ser ineficiente e distorciva. Entre as reformas prometidas e necessárias, mas não implantadas, destaca-se a tributária, que acabou abandonada depois da insistência do governo em reintroduzir a CPMF, que teria aumentado as distorções. Há propostas prontas no Congresso e várias dimensões a atacar, todas buscando um sistema tributário mais simples, não cumulativo e racional. É difícil saber o efeito líquido final do que foi feito, do que foi desfeito e do que deixou de ser feito. Parece-nos que entre as últimas estão as reformas mais importantes, com maior potencial de estimular a economia. Já as contrarreformas deixarão uma herança de atraso significativa. No final das contas, fica-se com a sensação de que a distância entre o discurso e as promessas, por um lado, e o realizado (e desfeito), por outro, é muito grande. A destruição do arcabouço fiscal, construído a duras penas, terá graves e duradoras consequências. Pedro Cavalcanti Ferreira é professor da EPGE-FGV e diretor da FGV Crescimento e DesenvolvimentoRenato Fragelli Cardoso é professor da Escola Brasileira de Economia e Finanças (EPGE-FGV). https://valor.globo.com/opiniao/coluna/reformas-contrarreformas-e-nao-reformas.ghtml

Ser transparente na remuneração de toda a empresa ajuda a combater a desigualdade salarial de gênero?

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Iniciativas vão desde uma empresa publicando abertamente a remuneração de todos os cargos até países multando quem não provar que paga igual para homens e mulheres Por Pilita Clark Como você se sentiria se seu empregador decidisse publicar on-line uma lista mostrando os nomes de todos os membros da equipe da empresa, além de sua função, onde moram e exatamente quanto cada um ganha? Uma empresa criada há 12 anos chamada Buffer, que ajuda as empresas a se venderem nas redes sociais, tem feito isso desde 2013. O cofundador e CEO, Joel Gascoigne, nascido no Reino Unido (salário US$ 298.958; endereço: Boulder, Colorado) achou que as vantagens de ser tão aberto poderiam incluir acabar com a discrepância salarial de gênero na empresa. O que é liderança pop-up e porque é importante no pós-pandemiaBenefícios corporativos estão invadindo a vida pessoalOs homens é que precisam de mentoria para mudar Para pessoas que acreditam que tornar os salários mais públicos ajuda a zerar essas diferenças, sua empresa se tornou, de certa forma, um modelo a ser imitado. Mas ainda não foi. São poucas as empresas que tomaram esse caminho, e eu nunca tive total certeza de que deveriam, considerando-se que a Buffer tinha uma disparidade salarial de gênero de 15% já em 2019, e de 12% em 2020. Esse percentual não era muito melhor que a diferença salarial total nos EUA, onde as mulheres que trabalham em período integral o ano inteiro normalmente ganharam 17% menos que os homens em 2020, uma disparidade que é ainda maior para mulheres negras. Mas, neste ano, a Buffer revelou que sua diferença salarial por gênero tinha caído para apenas 0,4%, o que significa que virtualmente desapareceu. Pelo fato de a empresa ter somente 84 funcionários, a notícia não teve repercussão. Além disso, a análise da Buffer, sugeria uma série de outros motivos, como mudanças nos escalões superiores que criaram uma equipe executiva quase totalmente feminina. Mesmo assim, dar publicidade aos salários teve certa influência, disse uma porta-voz na semana passada: “Acreditamos que esse nível de transparência nos obrigou a continuar a melhorar e a reduzir essa diferença salarial de gênero ano a ano”. Isso é importante em uma época em que as iniciativas para tornar os salários mais transparentes estão crescendo na União Europeia, Reino Unido, Estados Unidos e em outras regiões, embora não saiba de nenhuma tão arrojada. Uma medida comum, que o Reino Unido pretende testar em um programa-piloto divulgado em março: a proibição de pedir o histórico salarial aos funcionários potenciais. Perguntas desse tipo fazem com que as mulheres, em especial, se sintam menos confiantes em negociar um salário maior, diz Andrew Bazeley, da entidade assistencial por igualdade de gênero que fez campanha contra esse tipo de indagação. Outra medida que deve ser lançada em Nova York determina que os empregadores publiquem faixas salariais em anúncios de emprego. No Reino Unido, onde as pessoas que empregam 250 ou mais funcionários têm de informar suas diferenças salariais de gênero desde 2017, Bazeley diz que as que empregam mais de 250 funcionários zeraram suas diferenças. Em última instância, esse tipo de esforço não deveria ser necessário. Países do mundo inteiro têm leis que determinam pagamento de salário igual para função igual há décadas. As diferenças salariais permanecem em parte porque as mulheres predominam em funções de baixa remuneração mas também porque, mesmo quando exercem as mesmas funções que os homens, tendem menos a negociar aumento de salário. Eu desejo que mais países sigam o bastião do avanço feminino, a Islândia. Uma política salarial adotada no país em 2018 prevê que empresas com mais de 25 funcionários têm de provar que pagam o mesmo a homens e mulheres pelo exercício de funções de igual valor. As organizações recebem certificação quando fazem isso e as que não fizerem correm o risco de ter de pagar uma multa diária de até 50.000 coroas islandesas – cerca de 300 libras esterlinas (R$ 1.923,00). Dos 414 grupos que deveriam ter recebido certificação até agora, 79 não concluíram o processo, me informou a instituição do governo que zela pela igualdade. Nenhuma foi multada até agora, e a instituição diz que, embora haja sinais de que a política está reduzindo a discrepância salarial, não se saberá ainda por alguns anos qual foi o impacto total. Mesmo assim, se algum país romper essa duradoura desigualdade, porei a mão no fogo por ele. https://valor.globo.com/carreira/coluna/transparencia-salarial-avanca-pela-igualdade-entre-generos.ghtml

Ambiente de trabalho atual leva a estresse generalizado. Entenda

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Novo levantamento do Gallup em 160 países mostra que profissionais de todo o mundo estão desconectados emocionalmente de seus empregos e infelizes, e isso tem um custo para a economia mundial Por Jacilio Saraiva, Para o Valor Profissionais de todo o mundo estão estressados e desengajados. É o que indica o relatório anual State of the Global Workplace 2022, da empresa americana de pesquisas Gallup, que acaba de ser divulgado. De acordo com o estudo, que ouviu, em média, mil pessoas em cada um dos 160 países analisados, inclusive o Brasil, 60% dos respondentes se sentem emocionalmente desconectados dos seus empregos, 44% se consideram estressados, enquanto 19% descrevem o tempo no escritório como “extremamente infeliz”. Os reflexos da falta de engajamento dos profissionais têm um impacto direto nas economias dos países, segundo análise da Gallup. A queda na produtividade, na retenção de talentos e na lucratividade das companhias custa à economia mundial US$ 7,8 trilhões ao ano ou o equivalente a 11% do PIB global, garante a empresa. “A ideia de que ‘o trabalho é uma m…’ está em toda parte”, resume Jon Clifton, CEO da Gallup, na apresentação do levantamento. A pandemia, as longas horas de expediente e experiências ruins no ambiente corporativo são apontadas como as principais razões do cenário apontado pelo relatório, com dados coletados entre 2021 e março de 2022. No recorte sobre América Latina e Caribe, que inclui 19 países como Brasil, Argentina e Chile, foi detectada a taxa mais alta (53%) de “preocupações diárias” no horário de trabalho, ante 40% do resultado global. Já o índice de engajamento marcou 23%, dois pontos acima do placar geral (21%). Clifton destaca que outro estudo sobre burnout feito pela multinacional de pesquisas descobriu que a maior fonte do esgotamento mental nos ambientes corporativos é o “tratamento injusto”, seguida por uma carga incontrolável de atividades, falta de comunicação clara e de apoio das lideranças, além de uma “pressão irracional” nas entregas. “Todas essas causas têm uma coisa em comum: o chefe”, afirma o CEO. “Pegue um ruim e está quase garantido que você vai odiar o seu trabalho.” Para os pesquisadores, os resultados indicam que os empregadores devem repensar as ações de bem-estar das equipes, especialmente depois que a crise sanitária expôs mais vulnerabilidades físicas e emocionais. “Gestores de todos os lugares querem que seus times prosperem. E ajudar esses profissionais começa por ouvi-los”, diz Clifton. https://valor.globo.com/carreira/noticia/2022/07/18/ambiente-de-trabalho-atual-leva-a-estresse-generalizado-entenda.ghtml

Indústria perde 1 milhão de empregos em uma década no Brasil

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Renda do trabalhador caiu de 3,5 para 3 salários mínimos, segundo o IBGE Leonardo VieceliRIO DE JANEIRO Em uma década, a indústria brasileira perdeu cerca de 1 milhão de empregos, indica uma pesquisa divulgada nesta quinta-feira (21) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Conforme o levantamento, a população ocupada no setor era de 8,7 milhões de pessoas em 2011. Já sob impacto da pandemia de Covid-19, o número ficou em 7,7 milhões em 2020, ano mais recente com dados disponíveis. A perda de 1 milhão de postos de trabalho vem dessa comparação, aponta a PIA (Pesquisa Industrial Anual). Trabalhador atua em indústria na Bahia – Rafael Martins – 11 out.2021/Folhapress Segundo Synthia Santana, gerente de análise estrutural do IBGE, a redução de vagas pode ser associada a uma sucessão de turbulências enfrentadas pelas fábricas ao longo da década. “Em 2011, a gente tinha acabado de sair da crise global. Depois, veio a recessão [de 2015 e 2016]. Em 2020, surgiu outra crise [pandemia]. Alguns setores da indústria não conseguiram se recuperar”, disse a pesquisadora. O IBGE afirma que metade da redução de empregos, entre 2011 e 2020, ficou concentrada em três segmentos: confecção de artigos do vestuário e acessórios (-258,4 mil), preparação e fabricação de artigos de couro, artigos para viagem e calçados (-138,1 mil) e fabricação de produtos de metal, exceto máquinas e equipamentos (-134,2 mil). A pesquisa cita que atividades como essas provavelmente enfrentaram de forma mais intensa mudanças estruturais relacionadas, por exemplo, à evolução da https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg, à forte concorrência com o setor externo e à dependência do consumo interno. Na passagem de 2019 para 2020, mesmo com os efeitos do início da pandemia sobre parte da indústria, o setor como um todo conseguiu registrar incremento de 35,2 mil postos de trabalho. A população ocupada pulou de 7,6 milhões para 7,7 milhões. A fabricação de produtos alimentícios puxou essa expansão, com aumento de 121,5 mil postos. A demanda global por alimentos seguiu aquecida após a chegada da crise sanitária, o que ajudou a compensar as perdas de empregos de outros setores industriais em 2020, como o de coque, produtos derivados do petróleo e biocombustíveis (-91,9 mil). SALÁRIO FICA MENOR O IBGE também apontou que, ao longo da década, a renda do trabalhador industrial encolheu. De 2011 para 2020, o salário médio na indústria caiu de 3,5 para 3 salários mínimos. O levantamento ainda informou que o número de empresas industriais com uma ou mais pessoas ocupadas recuou pelo sétimo ano consecutivo –ou seja, cai desde 2014. O contingente atingiu 303,6 mil. No começo da década, em 2011, havia 313,2 mil indústrias. O número chegou a se aproximar em 2013 de 335 mil, o maior nível da série histórica.​ https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2022/07/industria-perde-1-milhao-de-empregos-em-uma-decada-no-brasil.shtml