Novo Imposto de Renda proposto pelo governo põe em xeque os fundos imobiliários

A proposta de reforma tributária do governo Jair Bolsonaro não foi comemorada pelo setor produtivo, por especialistas e, muito menos, por investidores. No último caso, há um desânimo ainda maior daqueles que investem em fundos imobiliários. Isso porque o governo quer cobrar 15% de Imposto de Renda nos dividendos distribuídos pelos fundos. Atualmente, o IR é isento na modalidade. Isso, na visão de especialistas, pode desacelerar ou até mesmo interromper o crescimento robusto dos fundos imobiliários nos últimos anos. O número de fundos listados em Bolsa subiu de 156, em dezembro de 2017, para 342 em abril deste ano, segundo o mais recente levantamento divulgado pela B3. Mesmo durante a pandemia, entre maio de 2020 e abril deste ano, saíram de um patrimônio líquido de R$ 98 bilhões para R$ 152 bilhões. “Somente neste ano, o mercado teve R$ 21 bilhões em captação, e eu esperava que dobrasse até o fim do ano. Mas agora, sem saber como vai ser a tributação, paralisa todo o mercado”, diz André Freitas, CEO da Hedge Investments, gestora de fundos imobiliários, com R$ 8 bilhões em ativos sob gestão. Mesmo com a reforma ainda longe de uma aprovação, a proposta já trouxe efeitos. O Índice de Fundos Imobiliários (IFIX) caiu 3% desde o anúncio. O número de emissões também deve ser afetado. Neste momento, há 25 operações, que totalizam R$ 6 bilhões, segundo levantamento feito pela Suno Research para o Estadão/Broadcast. Das 25 operações, há duas ofertas iniciais (fundos estreantes na Bolsa) e 23 emissões secundárias (de fundos já existentes). “Aquelas ofertas que começaram há mais tempo e estão no período final de captação, ultrapassando o mínimo previsto, serão concluídas. Mas, as que estão no comecinho, devem acabar suspensas”, diz Marcos Correa, especialista em fundos imobiliários da Suno. Coincidência ou não, o fundo XP Industrial suspendeu emissão de cotas de R$ 150 milhões, alegando “motivações técnicas, sem relação direta com o cenário político”. Uma das principais críticas de parte do mercado é como foi feita a escolha de tributação para fundos imobiliários. Outros produtos ligados ao setor continuarão isentos do IR, como as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). Tanto o LCI quanto o CRI são títulos de renda fixa emitidos por bancos e securitizadoras. Para Danilo Catarucci, sócio do banco de investimentos BR Partners, a mudança é uma “aberração” que pode atrapalhar o desenvolvimento do mercado imobiliário. Muitos viam nos fundos imobiliários uma possibilidade de turbinar os investimentos. Com a tributação, pode ficar menos vantajoso. “O setor imobiliário vinha trocando dívida bancária pelo mercado de capitais, e diversas empresas vinham economizando”, diz Catarucci. “E, se o mercado der uma desacelerada, os investidores também terão menos ativos com liquidez.” Para o economista Bernard Appy, fundador do Centro de Cidadania Fiscal, o melhor é tributar todo o setor. “As isenções geram muitas distorções”, afirma. Segundo ele, uma empresa de lucro presumido paga de 11,3% a 14,5% de imposto, enquanto quem recebe por fundos imobiliários não paga nada. “Obviamente, a mudança vai prejudicar os FIIs, mas a legislação atual os favorece indevidamente”, diz. O ESTADO DE S. PAULO

Longe de uma reforma tributária (Editorial)

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Quem planeja uma reforma tributária deve levar em conta, para começar, pelo menos três perguntas: 1) de quanto dinheiro o Estado precisa para cumprir as funções desejadas pela sociedade?; 2) como distribuir esse encargo de forma equitativa, sem sacrificar os menos abonados?; e 3) como cobrar tributos sem prejudicar o crescimento econômico, ou, se possível, como tributar e ao mesmo tempo estimular a produção e a eficiência? Por esses critérios, as propostas enviadas pelo governo federal ao Congresso estão longe de ser uma reforma. Têm caráter eleitoreiro, podem atender a necessidades fiscais imediatas e passam longe de qualquer projeto de modernização econômica e de expansão do potencial produtivo. É possível, no julgamento mais favorável, apontar detalhes positivos na proposta. Há uma tentativa de redistribuir o peso da tributação, com algum alívio para quem ganha menos. Mas seria preciso ir muito mais longe para consertar um sistema amplamente caracterizado pela má distribuição dos encargos, ou, em linguagem mais direta, pela injustiça. A mudança dos níveis de isenção e de progressividade das alíquotas, no caso do Imposto de Renda da pessoa física, é apenas uma tentativa de consertar uma tabela amplamente desatualizada. Tenta-se, naturalmente, compensar esse alívio em outros pontos do projeto. Também correta, em princípio, é a ideia de cobrar imposto sobre dividendos e aliviar a tributação do lucro empresarial. Bem aplicado, esse tipo de mudança torna menos injusto o sistema, tributando o ganho empresarial distribuído aos acionistas e favorecendo a preservação e a reaplicação do capital produtivo. Contemplam-se ao mesmo tempo, nesse caso, o crescimento econômico e a equidade distributiva. Mas há críticas à calibragem do tributo sobre os dividendos. Outros detalhes do encargo imposto às empresas também são criticados. Além disso, há uma reação, perfeitamente previsível, à cobrança de imposto sobre os ganhos financeiros. Protestos setoriais são esperados, quando se alteram as condições de cobrança, e haverá tempo, supostamente, para a discussão de todos os detalhes. Economistas, advogados tributaristas, administradores financeiros, políticos, lobistas e representantes do Ministério da Economia poderão examinar e debater cada ponto da proposta apresentada ao Congresso. Mas essa discussão, com o confronto de múltiplos interesses e múltiplos pontos de vista, será insuficiente para a geração de uma verdadeira reforma tributária, se faltarem a exploração e a articulação daquelas três questões básicas. O Executivo federal deveria ter liderado esse esforço, mas, até agora, ficou longe dele. O Ministério da Economia apenas propôs, inicialmente, a fusão do PIS/Pasep e Cofins. Ensaiou, durante algum tempo, negociar a recriação, sob algum disfarce, do chamado imposto do cheque, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), mas essa tentativa foi aparentemente abandonada por algum tempo. Qualquer tentativa séria de reforma teria de tratar também dos tributos cobrados por Estados e municípios, incluindo especialmente o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), principal fonte própria de receitas estaduais. Esse imposto, o mais pesado para os consumidores, é importante fator de iniquidade tributária. Além disso, é amplamente disfuncional, podendo variar entre Estados, complicando a gestão empresarial, facilitando guerras fiscais e encarecendo perigosamente a produção. O sistema de créditos tributários é incapaz de eliminar o efeito do ICMS sobre os custos. Trata-se, enfim, de um encargo prejudicial à competitividade internacional e, portanto, incompatível com a integração eficaz do Brasil no mercado global. Nenhuma proposta resultará numa verdadeira reforma sem incluir o ICMS. Qualquer projeto sério deveria tratar desse imposto e, muito provavelmente, fundi-lo com os tributos federais indiretos. Até aqui, o Executivo federal preferiu isentar-se dessa tarefa, negando uma importante contribuição ao desenvolvimento. O ESTADO DE S. PAULO

Via planeja vender serviço de logística até para concorrentes

Formada pelas operações de Casas Bahia e Ponto (ex-Ponto Frio), a Via deve lançar no quarto trimestre um pacote de logística para vendedores on-line. A companhia vai oferecer seus serviços de coleta, armazenagem e entrega de mercadorias, que constituem o “fulfillment”, como uma plataforma aberta. Lojistas que vendem em plataformas rivais, assim como os próprios “marketplaces” concorrentes, poderão usar os serviços da Via, que passará a explorar a atividade como um negócio autônomo. Um novo centro de distribuição, em Extrema (MG), será aberto em outubro para atender os vendedores, dentro do modelo “built to suit”, construído para locação pela Via. O centro começa neste ano a armazenar itens mais pesados, como refrigeradores e fogões. Há um centro de Jundiaí (SP) já voltado para o “marketplace”. “Queremos ser o ‘hub’ de logística das empresas. São 27 centros de distribuição no país, temos estrutura já montada para isso. Um dos nossos fortes é a logística de pesados, e vamos oferecer isso ao ‘seller’ e a outras companhias. [Essa distribuição] no país é cara e escassa e nós temos como atender”, diz Fernado Gasparini, diretor-executivo de logística. O movimento abre dois caminhos principais. Lojistas podem vender em qualquer site ou “app” e fechar acordos diretamente com a Via para o “fulfillment”. Neste caso, o vendedor pode deixar os produtos estocados nas centrais, e pela gestão da entrega, a Via recebe percentual sobre a venda. Segundo dados do site da rede, a taxa cobrada hoje no “marketplaces” varia de 13,5% a 16%, mas a empresa tem aplicado isenções temporárias para atrair vendedores. A Via não informa as taxas no fulfillment. Outro caminho que está sendo desenvolvido é o “marketplace” de qualquer empresa, como uma varejista rival, incluir, na hora de cotar a entrega, a opção de distribuição de itens pesados pela Via. Em outras cadeias, a Americanas faz entrega de itens maiores (acima de 30 kg) para os seus vendedores e também oferece o serviço a “marketplaces”, diz a empresa. O Magazine Luiza informa que a GFL, empresa do grupo na área, atende outras varejistas no envio de produtos pesados. “Pouca gente faz esse serviço de envio de pesados porque ele é complexo e caro se não tiver um grande volume de entrega e uma rede logística ampla. A Via pode estar vendo essa guerra dos ‘marketplaces’ e buscando criar um negócio paralelo onde sabe que navega melhor. E pode ainda reduzir eventual ociosidade de sua estrutura”, diz Roberto Wajnsztok, CEO da Origin Consultoria. Em relação aos acordos para oferecer o “fulfillment” a lojistas e outros “marketplaces”, Roberto Fulcherberguer, CEO da Via, chegou a comentar o assunto num evento da rede com analistas e investidores, há dois meses. “O seller [vendedor] não vai operar com todos os ‘marketplaces’ do país, porque isso implica em aumento de custos. Mas vai precisar de logística, especialmente do [item] pesado. De quebra, [A Via] pode até ajudar a concorrência. Mas não vemos isso como um problema. Logística é um business para nós”, disse. Na avaliação de Wajnsztok, da Origin Consultoria, “o ganho que a Via gera a outro ‘marketplace’ ao prestar o serviço é menor do que o benefício que ela cria para si, ao trazer esse ‘seller’ de outro ‘marketplace’ para perto dela”. A aceleração do “fulfillment”, porém, será em etapas. Neste momento, há negociações em andamento com varejistas de moda que podem usar a rede de distribuição da Via. Também estão no foco áreas como beleza, higiene e limpeza e ótica. Como no quarto trimestre há “Black Friday” e Natal, datas de alto tráfego, a ideia é deixar a estrutura pronta e avançar com fechamento de contratos, mas “rodar” mesmo o modelo no começo de 2022. A Via ainda estuda passar a operar, entre este ano e 2022, uma plataforma de logística de consumidores para consumidores, que fará o transporte de produtos entre pessoas físicas. Também mencionou a analistas, em abril, a expectativa de começar a vender em suas lojas físicas, da Casas Bahia e do Ponto, os produtos de terceiros do “marketplace”. Naquele momento, a estimativa era de que projeto piloto começasse em setembro. Para que esse modelo de distribuição a muitos públicos funcione, a Via vem montando diferentes sistemas. Para atender, em grande parte, o lojista pequeno, lançou neste ano o sistema da Envvias, plataforma suportada pela ASAP Log, braço logístico do grupo. Nele o despacho é pelos Correios usando a tabela de frete da Via. Para vendedores um pouco maiores, o grupo coleta os produtos na empresa e entrega usando a sua malha logística. Ainda há a opção de entrega das mercadorias em lojas da Via. No caso das lojas, todas as 1,1 mil unidades da empresa estão aptas para operar como pontos de armazenagem de produtos vendidos pelo on-line, mas cerca de 500 estão mais ativas. Para Gasparini, nem sempre ter todas as lojas habilitadas faz sentido. “A coleta dessas mercadorias, loja a loja, leva a transportadora a pegar cinco itens numa unidade, três produtos em outra. Fica mais complexo e caro. Nem sempre espalhar a rede faz sentido”, afirma. Atualmente, cerca de 40% das entregas da empresa ocorrem em até 24 horas. Há um ano, eram 17%. Como a empresa começou a explorar o “marketplace” depois que concorrentes, outras redes têm índices mais altos. Na busca por mais lojistas num negócio de competição crescente, em abril a empresa passou a isentar, por três meses, novos vendedores da cobrança da principal taxa do “marketplace”, o “take rate”, pago pelo lojista sobre a venda. A B2W ofereceu isenções por um período em 2020. Na Via, isso foi anunciado em fevereiro e duraria até maio, mas ainda está sendo aplicado, e vale para lojistas até limite de venda de R$ 50 mil por mês. No seu site, a Via diz que essa ação termina em dezembro. São cerca de 26 mil vendedores no site e “app” (último dado de março) e cerca de 50% usam o Envvias, sistema próprio de logística da Via. Entre as projeções que a Via têm reforçado a investidores