A necessária alternativa para o caos (Estadão)

Lula da Silva e Jair Bolsonaro nunca desceram do palanque. O petista, nem quando esteve preso; o presidente, nem diante de uma pilha de mortos. Logo, os dois saem em considerável vantagem na disputa eleitoral de 2022, cuja campanha, totalmente fora de hora, começou no exato instante em que saiu o resultado da eleição de 2018. Para enfrentá-los – e evitar que o País tenha que encarar no mínimo mais quatro anos de pesadelo –, as lideranças políticas, sociais e empresariais interessadas na democracia precisam urgentemente se organizar para construir, já, uma candidatura capaz de sensibilizar o eleitorado, em especial a parte – seguramente majoritária – que está farta da briga de rua em que se transformou a política brasileira nos últimos tempos. Esse objetivo, que nada tem de trivial, implica necessariamente que as forças do centro democrático sejam capazes de deixar as vaidades de lado e costurar uma candidatura única. No atual cenário, quando há quatro ou cinco possíveis candidatos desse campo para disputar uma eleição, é porque não há nenhum. Algo, contudo, parece ter se movido, especialmente depois que, por uma espantosa decisão judicial, o chefão petista Lula da Silva recuperou seus direitos políticos e deve ser candidato em 2022. Em entrevista ao Estado, o governador de São Paulo, João Doria, que trabalha há tempos para se candidatar à Presidência pelo PSDB, disse que “nada deve ser excluído”, ao ser questionado sobre a possibilidade de seu partido apoiar um candidato de outra legenda. “Uma aliança pelo Brasil não pode estabelecer prerrogativas de nomes”, declarou Doria. Para o governador, “o fracionamento (de candidaturas de centro) só atenderá ao interesse dos extremos”, e o centro precisa de “juízo” – isto é, de “capacidade de dialogar, formular um programa econômico e social para o Brasil e escolher um candidato que seja competitivo para disputar a eleição e, ao vencer, governar a Nação”. Outro político que já manifestou desejo de ser candidato, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, do DEM, foi na mesma linha do governador paulista quando disse ao jornal Valor que acredita na possibilidade de que seja encontrado ainda neste ano “o nome de quem vai levar a mensagem diferente das de Lula e de Bolsonaro”. Para Mandetta, agora é a hora de construir uma candidatura centrista “moderada” e “convergente”. É evidente que Mandetta, como Doria e outros, pretende ser o cabeça de chapa dessa candidatura “convergente”, e é legítimo que acalente o projeto. Todos os que se julgam capazes de tirar o Brasil da rota do desastre, por meio de políticas públicas racionais e competentes, emanadas de um governo que respeite as liberdades e as instituições, devem se apresentar para a tarefa publicamente, o mais rápido possível. Só assim será possível começar a discutir a sério quem, desses diversos postulantes, será o catalisador dos anseios dos brasileiros ajuizados, para construir uma candidatura capaz de emocionar os eleitores cansados tanto da corrupção antipolítica de Lula como da loucura antipolítica de Bolsonaro. Aos que, como o apresentador Luciano Huck, vacilam diante da pugna eleitoral – que deverá ser especialmente feroz numa disputa que envolverá dois veteranos da desfaçatez e da truculência, Lula e Bolsonaro –, resta rogar que anunciem sem demora sua decisão, dizendo em voz alta o que pretendem para o País e preparando o estômago para, se for o caso, enfrentar o vale-tudo dos palanques. O fato é que, a despeito das perspectivas sombrias, o País tem salvação – não obviamente pelo messianismo dos populistas autoritários e oportunistas que atormentam o Brasil há tempos, mas pelo respeito à lei, à coisa pública e à racionalidade econômica. Seja quem for o candidato designado para enfrentar os arruaceiros da democracia, deve ser um que aposte no Brasil ordeiro e pacífico, capaz de ser o País civilizado e desenvolvido com o qual sempre sonhamos. O ESTADO DE S. PAULO

STF analisa 7 mil processos sobre covid em um ano

hammer, horizontal, court

Há um ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretava que o mundo vivia uma pandemia. Desde então, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem priorizado a análise de casos relacionados à covid-19. De acordo com levantamento feito pela corte, mais de 7 mil processos relacionados ao assunto foram julgados em 2020, dos quais pelo menos 46 tiveram algum impacto econômico. Entre os destaques, estão ações que questionavam medidas do governo para alterar regras trabalhistas, pedidos para autorizar a suspensão do pagamento de parcelas das dívidas dos Estados e de precatórios, além da autorização para flexibilizar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Até o debate sobre o valor da mensalidade escolar e a compra de respiradores chegou ao STF. “A corte atuou de modo coeso em prol da segurança jurídica no momento em que a economia brasileira mais precisou. Cumpriu seu papel de guardiã da Constituição mesmo diante das dificuldades impostas com a pandemia”, destacou o presidente do Supremo, Luiz Fux. Desde o início da pandemia, os ministros têm afirmado que procuraram atuar tanto no sentido de preservar vidas, quanto de mitigar os impactos econômicos gerados pela situação de calamidade pública. Um dos casos de maior repercussão foi analisado logo no início da pandemia, em abril do ano passado, quando o plenário decidiu que a União, Estados e municípios tinham competência concorrente para adotar ações de combate à pandemia. O entendimento desagradou o presidente Jair Bolsonaro, que costuma fazer afirmações falsas dizendo que o STF proibiu o governo federal de atuar no enfrentamento da covid-19, Essa jurisprudência foi reafirmada em diversas ocasiões, de forma a deixar claro que é responsabilidade de todos os entes da federação adotar medidas em benefício da população na área da saúde. No campo trabalhista, o Supremo permitiu que patrões e empregados fechassem acordos individuais para reduzir a jornada de trabalho e salários durante a pandemia, dispensando a necessidade de que os sindicatos dessem aval para as negociações. A iniciativa fez parte de uma medida provisória editada pelo governo federal que criou um programa emergencial em razão do cenário de crise na economia. O STF também definiu que a contaminação de um trabalhador por covid-19 poderia ser considerada uma doença ocupacional, além de derrubar uma medida que limitava a atuação de auditores e impedia autuações. Em maio, o plenário referendou uma liminar que suspendeu artigos da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) durante o período em que vigorasse o estado de calamidade. Posteriormente, o Congresso aprovou o chamado “Orçamento de Guerra”, destinado exclusivamente a ações de combate à pandemia. Em 18 ações civis originárias (ACOs), o ministro Alexandre de Moraes determinou a suspensão do pagamento de parcelas das dívidas públicas dos Estados com a União. A decisão, em razão do momento “extraordinário e imprevisível”, foi condicionada à aplicação dos valores em ações relativas à pandemia. Em outra decisão, o ministro também determinou a destinação imediata de R$ 1,6 bilhão arrecadados através de um acordo da Operação Lava-Jato ao Ministério da Saúde. Já o ministro Luiz Fux autorizou a suspensão do plano de pagamentos de precatórios de 2020 determinado ao Estado de São Paulo pelo Tribunal de Justiça, mediante à condição que o dinheiro também fosse usado no enfrentamento à pandemia. Em outra frente, o plenário também determinou que os Estados podem estabelecer a obrigatoriedade da vacina contra a covid-19 e impor sanções a quem não quiser se imunizar. O ministro Ricardo Lewandowski autorizou ainda governadores e prefeitos a importar vacinas registradas por pelo menos uma autoridade sanitária estrangeira e liberadas para distribuição comercial, caso a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) não observasse o prazo de 72 horas para expedir a autorização. Também houve decisão no sentido impedir que a União requisitasse insumos contratados pelo governo de São Paulo, como agulhas e seringas. O então decano Celso de Mello, por sua vez, impediu que o Ministério da Saúde se apropriasse de respiradores comprados pelos Estados. O STF também julgou inconstitucionais leis do Ceará, do Maranhão e da Bahia que estabeleceram desconto obrigatório nas mensalidades da rede privada de ensino durante a pandemia. Em outras frentes, o tribunal atuou para garantir o cumprimento da Lei de Acesso à Informação (LAI) e o direito à saúde da população indígena. Por decisão do ministro Luís Roberto Barroso, o governo precisou desenvolver um Plano de Barreiras Sanitárias para conter o contágio e a mortalidade por covid-19 entre esses povos, mas, até agora, não apresentou uma proposta que atendesse de maneira satisfatória às recomendações da Corte. Neste ano, o STF continua proferindo decisões que impactam no Orçamento. Ontem, a ministra Rosa Weber determinou que o governo reativasse imediatamente leitos de UTI que foram fechados no Rio Grande do Sul e eram voltados para o tratamento da covid-19. Com a lotação dos hospitais e o colapso do sistema de saúde no país, a ministra já havia ordenado que o Ministério da Saúde adotasse a mesma medida para os Estados de São Paulo, Bahia, Maranhão e Piauí. Projeto de Lei sancionado ontem pelo presidente autoriza Estados, municípios e empresas a fazer aquisições. VALOR ECONÔMICO