Governo intensifica debate para destravar PEC emergencial
Lideranças do governo intensificaram ontem a costura política para a apresentação do relatório do senador Márcio Bittar (MDB-AC) sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) emergencial, que trará medidas de contenção de gastos do governo federal. Bittar teve uma reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para acertar detalhes técnicos do projeto. Nova reunião deverá acontecer hoje com a presença do presidente Jair Bolsonaro para definir se o parecer de Bittar será liberado na próxima semana. A estratégia em negociação é primeiro apresentar o relatório e ver a repercussão para então testar a viabilidade de votar no Senado ainda em 2020. Segundo apurou o Estadão, trabalha-se para incluir no texto uma proposta de desindexação de benefícios acima de um salário mínimo. Ou seja, permitir que tenham reajuste menores que a inflação. Com a medida, se abriria espaço no Orçamento para o novo programa social desejado pelo presidente em substituição ao Bolsa Família. As reuniões para o destravamento da agenda econômica animaram os investidores. O dólar fechou ontem no menor nível em dois meses, a R$ 5,33, e o principal índice da B3, a Bolsa paulista, subiu pelo terceiro dia consecutivo. Lideranças do Congresso informaram que até hoje deve haver um acordo para solucionar a briga política em torno da instalação da Comissão Mista de Orçamento (CMO). O colegiado até agora não começou os trabalhos porque, de olho nas eleições para o comando da Câmara dos Deputados a partir de fevereiro de 2021, diferentes grupos políticos reivindicam a presidência da comissão sem que haja um consenso. A disputa trava as votações da Câmara e retardam a discussões em torno da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Orçamento de 2021. Uma das possibilidades em discussão é deixar a presidência do colegiado ser definida na votação dos membros da CMO em vez de se escolher o nome por um acordo entre os partidos, como é tradicionalmente feito. Hoje, a presidência da comissão é disputada pelo deputado Elmar Nascimento (DEMBA), aliado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e pela deputada Flávia Arruda (PL-DF), indicada pelo Centrão. O nome de Nascimento foi definido em fevereiro pelos maiores partidos da Câmara dos Deputados. No entanto, com a saída do DEM e do MDB do “blocão”, em julho deste ano, o líder desse grupo, o deputado Arthur Lira (PP-AL), decidiu indicar Arruda. O imbróglio tem como pano de fundo a sucessão da presidência da Câmara, já que o controle da CMO tem a capacidade de atrair votos. Hoje, esse grupo formal da Câmara, é composto por PL, PP, PSD, Solidariedade e Avante, todos da base do governo e com o total de 135 deputados. Apesar das tentativas de entendimento, os parlamentares, no entanto, ainda não bateram o martelo em uma solução que pudesse levar ao fim da obstrução dos partidos da base do governo e a retomada das votações. “Os diálogos seguem de forma permanente, mas sem definição por enquanto”, disse o líder do DEM, Efraim Filho (PB). A Lei de Diretrizes Orçamentárias precisa ser votada obrigatoriamente este não para evitar um apagão de gastos no início de 2021. O ESTADO DE S. PAULO
A discussão em torno da desoneração da folha (Edson C. Alves e Ricardo Costa)
A Desoneração da Folha de Pagamento é tema constante na pauta do Governo Federal desde 2011, como resposta à crise econômica internacional de 2008, ocasião em que o citado regime foi introduzido originalmente no Brasil por meio da Medida Provisória nº 540/2011 (Plano Brasil Maior), a qual posteriormente foi convertida na Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011. A Lei nº 12.546/2011, visando dar maior competitividade às empresas brasileiras, obrigou a substituição da contribuição previdenciária patronal de 20% incidente sobre a remuneração paga aos segurados empregados, avulsos e contribuintes individuais (artigo 22, da Lei 8.212, de 24 de julho de 1991), pela contribuição social incidente sobre receita bruta auferida pelas empresas que exerciam determinadas atividades econômicas (artigos 7º e 8º da Lei 12.546/2011). O fundamento do diploma legal foi a alínea “b” do inciso I do artigo 195 da Constituição, cuja redação foi alterada pela Emenda Constitucional 42, de 19 de dezembro de 2003, que incluiu o parágrafo 13º no artigo 195 e autorizou a substituição gradual, total ou parcial, da contribuição do empregador incidente sobre a folha de salário, por contribuição incidente sobre a receita ou o faturamento. Cumpre destacar que a Lei nº 12.546/11 foi alterada sensivelmente pela Lei nº 13.161/15, no tocante aos setores beneficiados e às alíquotas da CPRB, bem como estabeleceu percentuais que variam entre 1% e 4,5%, além de tornar a contribuição facultativa, de tal sorte que as empresas que exercem as atividades previstas na referida lei passaram a ter o direito de optar anualmente e de forma irretratável, sobre todo o calendário fiscal, por continuar recolhendo a contribuição previdenciária sobre o faturamento ao invés da folha de salário. Ainda necessário salientar que foi publicada a MP nº 774/2017, que tinha por objetivo revogar a CPRB para diversos setores da economia, sob a justificativa do aumento do déficit da previdência social causado pela referida renúncia fiscal, no entanto sua vigência foi encerrada sem a conversão em lei. Prorrogação para 17 setores A redução de 28 para 17 os setores beneficiados ocorreu em 2018, por meio da Lei nº 13.670, os quais seriam contemplados até 31 de dezembro deste ano, entre outras, as empresas que exercem os serviços de https://sindeprestem.com.br/wp-content/uploads/2020/10/internet-cyber-network-3563638-1.jpg da informação, call center, transporte coletivo de passageiros, construção civil e de obras de infraestrutura, jornalismo e de radiodifusão, assim como alguns segmentos industriais, como o têxtil e de proteína animal. Não bastando, em abril de 2020 foi publicada a MP nº 936, a qual instituiu o Programa Especial de Manutenção do Emprego e da Renda em razão da pandemia da Covid-19. No entanto, quando de sua conversão para a Lei nº 14.020, ainda no mês de julho, foi inserido um artigo que previa a prorrogação do prazo de validade da CPRB para até 31 de dezembro de 2021, sob a justificativa de estimular os setores por ela abrangidos, tudo como resposta a atual crise econômica, no entanto este foi, como sabido, vetado pelo presidente da República e recentemente derrubado pelo Congresso Nacional. Ocorre que a derrubada do veto presidencial traz consequências tanto sob o ponto de vista do orçamento governamental, já que a renúncia fiscal, conforme dados da Receita Federal do Brasil, foi de 10,5 bilhões só em 2020 e também para o contribuinte, posto que de posse de tal informação pode planejar suas atividades para 2021. O contribuinte tem uma tarefa árdua pela frente relacionada a realizar suas projeções para 2021 em um cenário de incertezas e a recomendação é que a empresa contrate consultoria especializada para saber qual é o melhor regime no seu caso específico. É que apenas exercer uma dentre as 17 atividades mantidas na desoneração não é garantia de alívio para as empresas. Nessa conta é preciso levar em consideração não apenas o desejo do empregador com as pretensas contratações, mas também o cenário econômico de 2021 visando fazer a melhor opção entre a tributação com base no faturamento ou na folha de salários. Governo Federal e a abrangência da Desoneração Do lado do Governo também o desafio é grande, já que a renúncia fiscal força o Ministério da Economia a refletir sobre outras formas de compensação, ocasião em que proliferam notícias de suposta volta da CPMF. O fato é que o tema faz parte da pauta de assuntos a serem debatidos na Reforma Tributária, já que a Desoneração deve ser mais abrangente exatamente para que o empresário possa fazer a sua conta individual e optar pelo caminho que onere menos o seu negócio. Também a forma de compensação dessa expressiva renúncia fiscal deve ser examinada com a devida cautela, sob pena de onerar toda a sociedade e principalmente as empresas, as quais obviamente fazem a maior parte da circulação de riquezas no país. Portanto, com a concretização da desoneração da folha de pagamento mediante a derrubada do veto presidencial, as empresas desde já devem se planejar para 2021 com toda a assistência e cautela pertinente, além do Governo ampliar os setores que podem optar pelo regime aproveitando-se da reforma tributária. *Edson C. Alves, gerente de Planejamento Tributário e Operações na FNCA; Ricardo Costa, coordenador Jurídico e Tributário na FNCA O ESTADO DE S. PAULO
Selic pode perder eficácia com dívida alta
O aumento substancial da dívida pública, a manutenção dos juros no seu piso histórico de 2% ao ano, mesmo com inflação em aceleração, e a desconfiança cada vez maior de que o País está à beira de um “populismo fiscal” realimentaram o debate sobre o risco de dominância fiscal no Brasil. O tema é árido e pouco conhecido fora das rodas de debate econômico, mas tem repercussão direta no bolso dos brasileiros. Numa situação de dominância, as ferramentas que o Banco Central tem para controlar o avanço dos preços, entre elas a Selic, perdem potência, e seu uso pode até mesmo provocar o efeito inverso de impulsionar a inflação, dado o impacto que teriam no aumento do custo do endividamento da União. Para abordar as saídas da crise fiscal provocada pela alta do endividamento do País, o Estadão começa a partir de amanhã uma série de entrevistas com especialistas. A primeira delas será com o ex-presidente do BC Affonso Celso Pastore. Na dominância fiscal, é como se o BC estivesse numa encruzilhada. Se eleva os juros para conter a alta de preços, traz problema ao Tesouro Nacional, elevando ainda mais o endividamento e, no limite, abrindo a porta para mais inflação. Se não faz nada, a inflação pode ganhar força de qualquer maneira. O diagnóstico atual é que o Brasil ainda não vive essa situação, considerada o pior dos mundos pelos economistas, uma vez que a aceleração da inflação força um ajuste fiscal pelo lado mais perverso: corroendo o poder de compra de famílias, sobretudo de menor renda. Mas os economistas alertam que é preciso agir com firmeza para mostrar compromisso com o ajuste nas contas públicas e fugir desse caminho. A fotografia das finanças e do cenário político trouxe à tona a preocupação com a dominância, que já foi tema de debate na transição entre os governos FHC e Lula e em 2015/2016, no auge da crise durante o governo Dilma Rousseff. Tanto em 2002 quanto em 2016, as incertezas se dissiparam após sinalizações de compromisso com medidas de ajuste. A perspectiva hoje é de que a dívida bruta do governo termine o ano em 96% do PIB e passe dos 100% em 2025, segundo o Tesouro, sendo que dois terços têm custo diretamente atrelado à Selic, a taxa básica de juros. O BC, por sua vez, tem sido cada vez mais cobrado a alterar sua prescrição futura para os juros, indicando possível aumento da Selic, diante da aceleração dos preços de matérias-primas e insumos para a indústria. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, tem reforçado em seus discursos a necessidade de ter “disciplina fiscal”. “É responsabilidade de todos entender que temos agora um problema”, disse ontem em entrevista à Globonews. O economista Carlos Kawall, diretor do Asa Bank e ex-secretário do Tesouro Nacional, explica que, numa situação de dominância, a própria alta da taxa de juros se torna contraproducente porque eleva ainda mais a dívida e amplia a desconfiança em relação ao problema fiscal. “Aí, a única solução é deixar a taxa de juros mais baixa, de tal forma que a inflação ao final se torne a maneira de ajustar as contas públicas.” Já o economista José Júlio Senna, chefe do Centro de Estudos Monetários do IBRE/FGV e ex-diretor do Banco Central, alerta que só manter o teto não resolve. “Não adianta atacar um ou dois elementos da despesa, tem de ser ‘arrasa quarteirão’. Frear as quatro rodas.” O economista Fabio Terra, professor da Universidade Federal do ABC e diretor da Associação Keynesiana Brasileira (AKB), entende que a dominância fiscal seria uma “hipótese exagerada”. “Hoje nem sequer temos dinâmica inflacionária para se falar de dominância fiscal ocorrendo”, avalia. Para o economista Roberto Ellery, professor da Universidade de Brasília, há risco de o Brasil chegar a uma situação de dominância fiscal. “A dívida está subindo muito, e não está claro como vai ser o próximo ano. As pessoas podem começar a achar que a dívida pode sair de controle, e isso abre a porta para a dominância fiscal.”