TST determina inclusão de prestador de serviço em processo sobre terceirização

Valor Econômico – 23/02/2022 –

A partir de agora, ficará mais difícil para o trabalhador terceirizado obter vínculo de emprego em processo contra empresas tomadoras de serviço. O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) deu uma guinada na sua jurisprudência e definiu que no processo deve constar como parte, além do tomador, o prestador de serviços. A decisão, em recurso repetitivo, deve ser seguida por toda a Justiça do Trabalho.

O impacto, segundo ministros e advogados da área, deve ser significativo, uma vez que poderão ser anuladas decisões ou até mesmo processos ajuizados apenas contra o tomador de serviços. Além disso, acrescentam, a participação ativa do prestador deve tornar a batalha mais difícil para o trabalhador.

O tema é um desdobramento da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que permitiu, em 2018, a terceirização ampla e irrestrita. Depois do julgamento do STF, a discussão passou a não ser mais sobre a legalidade, mas sobre a possibilidade de fraude na relação de trabalho. Nesses processos, o empregado argumenta que seu real empregador não seria o prestador de serviço, que o contratou, mas o próprio tomador.

Foram localizadas, desde 2014, 59, 9 mil ações que têm em seus documentos os termos “litisconsorte”, “terceirização”, “fraude”, “prestador de serviços” e “tomador de serviços”, segundo levantamento exclusivo feito pelo Data Lawyer ao Valor. Das ações que foram julgadas até agora, 29.161 (48, 6%) tiveram como resultado parcialmente procedente e 13.953 (23,25%) resultaram em acordo.

A decisão do Pleno também deve barrar, segundo ministros e advogados, uma estratégia adotada pela defesa de trabalhadores, após a decisão do Supremo. Era comum, o empregado renunciar, nos casos em que havia as duas empresas, a pretensão contra a prestadora após sentença favorável, por exemplo, pelo fato de o tomador em geral não recorrer da decisão – apenas o prestador. Se o recurso fosse analisado, o empregado teria a decisão reformada, porque a Justiça passaria a aplicar o que foi decidido pelo Supremo. Agora, essa renúncia tem efeito sobre todos os envolvidos.

A decisão do Pleno do TST foi tomada por maioria. Foram 13 ministros entendendo pela necessária participação da prestadora de serviços nos processos. Eles também entenderam que essa decisão terá que ser unitária – deve valer para todas as partes. Já outros 11 declararam ser facultativa a inclusão do prestador. Desses 11, sete ainda entenderam que não seria unitária, mas simples, ou seja, a decisão não afetaria quem não estivesse no processo.

A maioria seguiu o voto do ministro Douglas Alencar Rodrigues. Ele abriu a divergência por entender que, sem a participação do prestador de serviços, o processo poderia ser considerado nulo, uma vez que nem todos os participantes da relação foram ouvidos. E como a relação era com a prestadora de serviços, acrescentou, ela poderia oferecer documentos e provas importantes para o processo.

Haviam mais duas correntes teóricas. Uma delas, do relator, ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, que defendia não existir regra no Direito do Trabalho que obrigue o empregado a entrar contra a prestadora de serviços, ou qualquer um que seja, no processo. Ou seja, ele pode entrar com a ação apenas contra o tomador. Mas quando houver decisão, tem ser uniforme para os dois (prestador e tomador). Nesse caso, quem não estiver no processo pode ingressar depois, se assim quiser.

Uma terceira via foi apresentada pelo ministro Augusto Cesar Carvalho. Para ele, cabe o autor da ação escolher contra quem quer litigar. Mas a parte que ficou fora do processo não poderia ingressar posteriormente, uma uma vez que a decisão não seria contra ela.

O caso julgado envolve um funcionário que trabalhava no call center da Liqui Corp, prestadora de serviços para o Itaú Unibanco. Ele entrou com ação contra o banco alegando que ele era seu real empregador e pedia reconhecimento de vínculo, o que tinha sido admitido no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Pernambuco, sem a participação da prestadora no processo. A Liqui Corp então recorreu ao TST, que afetou o processo ao Pleno.

Segundo o advogado que assessora a Liqui Corp no processo, Bruno Mafra, sócio trabalhista do Rueda & Rueda Advogados, o resultado foi o melhor possível para as empresas e deve ter “um impacto gigantesco” para as ações em curso e para as futuras. A solução, acrescenta, assegura os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa. azia sentido entrar com ação contra um potencial empregador e não chamar o real empregador para discutir”, diz.

Agora, afirma Mafra, a Justiça do Trabalho terá que analisar cada caso, porque conforme foi decidido pelo Pleno deve haver a anulação de todos os atos posteriores ao pedido de ingresso da prestadora de serviço nesses processos. “Existem processos que terão que ser anulados desde sua origem. E como o prazo é de dois anos para o empregado entrar com ação, pode ser que não dê tempo de entrar com outro pedido”, diz.

O TST, ao ampliar os efeitos da renúncia, explica o advogado, também deve barrar a estratégia de trabalhadores de não incluir o prestador de serviços para não aplicar o que foi decidido pelo Supremo.

Para o advogado que defendeu o trabalhador, João Fernando Amorim, do Amorim & Luna Advogados Associados, essa é uma mudança radical da jurisprudência, uma vez que o TST já tinha entendimento pacífico de que o trabalhador poderia escolher contra quem entrar com ação.

Por nota, o Itaú Unibanco informa entender que a decisão do TST “é de grande importância para a manutenção da segurança jurídica das relações formadas pela terceirização dos serviços e para garantir que o resultado da ação produza efeitos tanto para a empresa empregadora quanto para a contratante do serviço, como já decidido pelo STF”.

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