Piora da inflação esquenta debate sobre alta da Selic acima de 0,75 ponto

A rápida deterioração na expectativa para a inflação oficial em 2022 aumenta o debate sobre a chance de o Banco Central ser mais agressivo com a alta da taxa Selic em reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) na quarta-feira, 16, embora esse não seja o cenário mais provável, dizem economistas consultados pelo Estadão/Broadcast.

Segundo os especialistas, um aumento mais forte do que o de 0,75 ponto porcentual precificado de forma majoritária pelo mercado funcionaria como um “choque de credibilidade” e poderia ajudar a segurar as projeções para o ano que vem, que é o horizonte relevante da política monetária. Também não seria uma novidade para este Banco Central, que já surpreendeu o mercado antes, iniciando o ciclo de aperto com o ritmo de 0,75 ponto, em março, contra a expectativa de 0,50 ponto.

Outros analistas, porém, avaliam que a retirada da sinalização de ajuste parcial pelo Copom já tende a conter nova piora no quadro do ano que vem.

Atualmente a meta da taxa Selic é de 3,50% e foi fixada na última reunião do Copom em 5 de maio, com um aumento de 0,75 ponto.

Nesta segunda-feira, o Boletim Focus do Banco Central registrou a décima alta semanal seguida da expectativa mediana para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2021 para 5,82% – muito acima do teto da meta de 5,25%. Para 2022, foi a quinta elevação consecutiva. Desta vez, a mediana das estimativas subiu de 3,70% para 3,78% – 0,28 ponto porcentual acima do alvo central (3,50%).

A economista-chefe do JPMorgan no Brasil, Cassiana Fernandez, destaca que já esperava avanço das expectativas de inflação após o IPCA ter superado as expectativas em maio. O índice de inflação subiu 0,83%, contra 0,76% do teto da pesquisa do Projeções Broadcast.

Contudo, a economista afirma que a projeção do Boletim Focus foi pior do que a esperada. Houve aumento das estimativas para a inflação de 2022 ao mesmo tempo em que ocorreram a alta das projeções para a taxa Selic no fim de 2021 (de 5,75% para 6,25%) e a queda na expectativa de câmbio, de R$ 5,30 para R$ 5,18 no fim deste ano. Para 2022, a estimativa do mercado para o dólar caiu de R$ 5,30 para R$ 5,20.

“Assim, aumentou a probabilidade de um aumento de 1 ponto porcentual na reunião de quarta-feira, mas ainda não acredito ser o mais provável”, diz Fernandez, que já havia considerado essa possibilidade no relatório pré-Copom divulgado sexta-feira (11), lembrando que o Banco Central já adotou a estratégia de antecipar o ajuste.

“Parece que a mensagem que os analistas estão passando ao Banco Central hoje é que, mesmo com a normalização total dos juros este ano, pode não ser suficiente para garantir a convergência da inflação no ano calendário de 2022”, completa a economista.

O JP Morgan projeta que a taxa Selic vai subir até 6,50% este ano, patamar em que ficaria até o fim de 2022, mas o banco reconhece que os riscos são para cima.

O economista-chefe do Banco Alfa, Luis Otavio de Souza Leal, também avalia que cresceu a chance de uma alta da Selic de 1 ponto porcentual no Copom desta semana após a Focus. Esse não é o cenário-base do economista, que espera alta de 0,75 ponto, a 4,25%, sinalização de nova alta da mesma magnitude em agosto e retirada da indicação de normalização parcial da política monetária, sem nenhuma qualificação sobre como deve ser o ajuste.

Mas ele admite que uma alta de 1 ponto daria um choque de credibilidade adicional a favor da convergência para a meta de inflação em 2022. “Ou pelo menos minimizaria o risco de piorar mais. Até porque seria um bom motivo para o dólar romper a barreira dos R$ 5,00. Por isso, não dá para descartar.” Atualmente, Souza Leal aguarda que o câmbio termine o ano em R$ 5,40, mas admite que pode ficar mais próximo de R$ 5,20.

Para a Selic, o economista espera aumento até 6,25% em dezembro, chegando a 6,50% em janeiro. Ele ainda não acredita em um cenário em que os juros básicos tenham que ir além do nível neutro, porque, além do hiato do produto aberto com a pandemia de covid-19, o País ainda está “devendo” crescimento da recessão de 2015-2016. Em seus cálculos, essa dívida só seria paga na virada do primeiro para o segundo semestre de 2022.

Já o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira, avalia que a retirada da sinalização de ajuste parcial da política monetária pelo Banco Central já seria uma indicação de que o Copom persegue uma Selic mais alta do que anteriormente. Além disso, Oliveira chama atenção para a queda na expectativa de Produto Interno Bruto (PIB) de 2022, também na Focus, de 2,38% para 2,31%. A mediana para 2021 subiu de 4,36% para 4,85%.

“Se o Copom quiser ser mais ‘agressivo’, uma solução seria deixar em aberto o ritmo de alta para os próximos passos, sinalizando a possibilidade de aumentar o ritmo. Porém, acredito que a probabilidade é baixa neste momento, pois o desvio das expectativas para o IPCA de 2022 não é grande e ainda há muita incerteza no cenário”, diz Oliveira, que espera 6% para o juro básico no fim de 2021 e 7% no término de 2022.

Da mesma forma, o economista-chefe da Garde Asset, Daniel Weeks, afirma que não vê uma alteração tão profunda no cenário que demande uma urgência ainda maior no ajuste. “O passo de 0,75 ponto já é bem acelerado.” Para o economista, o Copom deve seguir o roteiro de aumentar o juro básico em 0,75 ponto esta semana e sinalizar outra alta da mesma magnitude. Além disso, deve alterar a indicação de ajuste parcial para ajuste completo, até o nível neutro. A Garde espera alta da taxa Selic a 6,50% no fim deste ano.

O ESTADO DE S. PAULO

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