Folha de S.Paulo –
A avaliação diligente de reformas institucionais requer comparar o quadro que sucede a sua implantação com situações, por vezes hipotéticas, em que tais reformas não existissem. Esse método, consagrado na ciência, permite estimar se houve efeito e, em caso afirmativo, qual terá sido a sua dimensão.
A política não raro atropela esses protocolos. Como o desemprego e a informalidade mantiveram-se elevados após as alterações de 2017 nas normas trabalhistas, adversários da mudança —como o PT e centrais sindicais— aproveitam-se disso para propugnar pela revogação da reforma.
O fato de ter ocorrido nesse período uma reviravolta global e duradoura na sociedade e na economia em razão da pandemia de coronavírus costuma ser menosprezado nessas críticas. Relevam-se também outros fenômenos menos vistosos, como mudanças tecnológicas e nos hábitos de consumo.
Os ataques carregados de ignorância, no entanto, podem sair pela culatra, pois uma recuperação cíclica do mercado de trabalho, como a que parece estar em curso, ensejará reações do outro lado, também mal embasadas em evidências, louvando a reforma pela melhora circunstancial dos indicadores.
Por trás do barulho produzido na disputa pelo poder, alguns dados permitem enxergar contornos da situação deixada pela reforma.
A modalidade intermitente de trabalho, introduzida em 2017, respondeu por menos de 5% das contratações em 2021. Dificilmente poderá ser responsabilizada pela “precarização” do emprego usualmente alegada pela crítica sindical.
O volume de ações na Justiça do Trabalho reduziu-se logo após a reforma, mesmo antes da pandemia. É possível que o rebalanceamento dos riscos de perder processos desencadeado pela reforma —trabalhadores passaram a arcar com custas em caso de derrota— tenha inibido a litigância excessiva.
O imposto sindical encerrado pela reforma, que derramava mais de R$ 3 bilhões anuais nas organizações, nem de longe foi substituído pelas contribuições, que mal ultrapassaram R$ 60 milhões em 2021. Eis uma motivação bastante palpável para o desconforto de sindicatos com o statu quo após 2017.
Apesar de flutuações causadas por fatores externos, a altíssima informalidade —que hoje abrange cerca de 40% da população ocupada— permanece o principal problema do mercado de trabalho brasileiro. Atacá-lo com retrocessos ao século 20, porém, não vai resolver.
Uma série de custos implicados no emprego com carteira assinada não está associada ao bem-estar dos trabalhadores. Identificá-los com a ajuda da melhor técnica disponível poderá iluminar o caminho da política para reduzi-los.