O desemprego como legado

O Estado de S.Paulo –

Desemprego acima de 10% poderá estender-se até 2024, segundo economistas do setor financeiro, e todo candidato a presidente deveria levar a sério essa previsão. Se esse prognóstico se confirmar, metade do novo mandato será vivida num cenário ainda sombrio, com negócios emperrados e muitos milhões de brasileiros ainda atolados na pobreza. Ninguém deveria chegar ao Palácio do Planalto, em janeiro do próximo ano, sem um plano para vencer a estagnação econômica, reindustrializar o País, ampliar o emprego e, é claro, arrumar as contas federais e controlar a dívida pública. Mesmo com desocupação pouco abaixo de dois dígitos, o quadro ainda será muito ruim – certamente pior do que na maior parte das grandes economias.

Ainda há muita gente sem renda, apesar de alguma melhora no mercado de trabalho desde o ano passado, comentou o economista Maurício Nakahodo, do Banco MUFG Brasil, citado pelo Estadão. Num cenário mais favorável, mais trabalhadores poderão entrar no mercado, ou simplesmente retornar, e a oferta de vagas poderá ser insuficiente para acomodar essa demanda. O economista Rodolfo Margato, da XP Investimentos, estima desemprego de 11% no fim deste ano e de 10,4% no encerramento do próximo. Pelos últimos dados oficiais, os desocupados eram 12 milhões no trimestre dezembro-fevereiro – uma parcela correspondente a 11,2% da força de trabalho.

A lenta melhora do emprego, as condições atuais da atividade e as projeções de avanço da economia dão credibilidade aos prognósticos pouco otimistas em relação ao mercado de trabalho. O setor industrial continua muito fraco, numa trajetória com muitos tropeços. Em fevereiro, a indústria produziu 0,7% mais que no mês anterior. Esse aumento ficou longe de compensar o tombo de janeiro, quando o volume produzido diminuiu 2,2%. Em 12 meses houve expansão de 2,8%, um ganho insuficiente para afetar de forma significativa a trajetória mais longa.

A produção acumulada no ano foi 5,8% menor que a do primeiro bimestre de 2021. Além disso, o desempenho registrado em fevereiro foi 2,6% inferior ao de dois anos antes, isto é, do mês anterior ao primeiro grande impacto da pandemia. Mas o quadro mais amplo é bem mais feio. A média do trimestre até fevereiro ficou 18,9% abaixo do pico histórico registrado em maio de 2011. Houve oscilações, naturalmente, nos anos seguintes, mas a tendência geral foi de enfraquecimento da indústria.

Em todo esse período houve alto desemprego, geralmente acima de 7% da força de trabalho. Tomem-se, por exemplo, os números do trimestre móvel de dezembro a fevereiro. Entre 2013 e 2022, a taxa foi superior a 10% em sete anos. O último levantamento mostrou uma desocupação de 11,2%, com 12 milhões de pessoas em busca de vagas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Não há, por enquanto, sinais de grande mudança neste ano e no próximo. Divulgadas há poucos dias, as novas projeções do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apontam crescimento de 1,1% para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2022 e de 1,7% em 2023.

A expansão será sustentada pela agropecuária e pelos serviços. A produção industrial deve encolher 0,8% neste ano e crescer 0,8% no próximo. Do lado da demanda, o relatório destaca a expansão de 1,1% do consumo familiar, neste ano, favorecido pelo Auxílio Brasil e por alguma melhora do emprego e do crédito. Mas é difícil imaginar condições de crédito muito mais favoráveis, quando se preveem juros básicos de 12,75% a partir de maio.

Em outro estudo, também divulgado em março, o Ipea estima para 2022 um crescimento do emprego menos acentuado que o do último ano, por causa de “um desempenho mais moderado da atividade econômica”.

Enfim, a inflação poderá ser menor que a de 2021, mas deverá superar 6,5%, segundo projeção do mercado. A alta de preços continuará, portanto, erodindo o poder de compra das famílias, e também esse detalhe é importante para qualquer visão prospectiva – dos cidadãos, dos empresários e, naturalmente, dos candidatos à Presidência.

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