Necessidade de reformas é consenso entre assessores de pré-candidatos à Presidência

Folha de S.Paulo – 03/02/2022 –

Apesar da controvérsia levantada pelo PT em torno das mudanças trabalhistas no governo Temer, os assessores econômicos dos principais candidatos à Presidência da República —de esquerda e direita— concordam sobre a necessidade de o eleito em 2022 implementar reformas.

Em entrevistas à Folha, os assessores dos pré-candidatos mencionam principalmente as reformas tributária e administrativa e mencionam como objetivos o corte de gastos, a simplificação do arcabouço legal brasileiro e o estímulo ao investimento privado.

Mesmo no PT —que falou recentemente em rever as alterações trabalhistas do governo Michel Temer e se posiciona contra a reforma administrativa apresentada pelo governo Jair Bolsonaro—, são defendidas mudanças nas regras do funcionalismo para cortar custos com salários de servidores.

“Após a Previdência, a maior despesa federal é folha de pagamento. Então o próximo governo terá de fazer uma reforma administrativa para os novos ingressantes”, afirma Nelson Barbosa, ex-ministro da Fazenda (no fim do governo Dilma Rousseff) e integrante do grupo de assessores econômicos do pré-candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Barbosa, que também é colunista da Folha, defende que a reforma administrativa não precisa mexer com os direitos dos atuais servidores. “Como a taxa de renovação vai estar alta, com muitos perto da aposentadoria, em quatro ou cinco anos essas regras estarão valendo para a maioria dos servidores”, diz.

O objetivo da reforma seria baixar os salários de entrada no serviço público e prolongar o tempo de progressão na carreira. Já discussões sobre a estabilidade no emprego não entrariam na pauta.

“O [atual] governo começou a discussão pela estabilidade do servidor público, e isso travou a reforma”, afirma.

“Tem que ter estabilidade, do contrário vai ter interferência política [na seleção dos servidores], vai ter rachadinha [prática criminosa em que funcionários públicos entregam parte de seus salários aos superiores]”, diz Barbosa.

A reforma tributária também é vista como uma prioridade pelo economista do PT, que defende um ajuste fiscal que considere também o lado das receitas públicas —mas de forma gradual.

“Sem reinventar a roda, a história econômica mostra que ajustes bem-sucedidos distribuem os valores entre receitas e despesas”, diz. “Só que o governo [atual] quer fazer isso na canetada, de uma hora para a outra. Os ricos podem pagar mais, mas isso não pode ser feito de maneira imediata. Tem de ser uma implementação gradual”, afirma.

Barbosa concorda com a proposta enviada pelo governo ao Congresso, que une PIS e Cofins na nova CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). “Acho correta”, diz.

E também concorda com as propostas de reforma ampla de autoria do Congresso —como a PEC (proposta de emenda à Constituição) 110, que na atual versão promove uma grande fusão de impostos e cria um novo imposto federal e outro para estados e municípios (o chamado IVA dual).

O ministro Paulo Guedes (Economia), que ainda não foi confirmado como assessor da campanha de Bolsonaro, tem persistido na agenda de reformas —como a tributária e a administrativa, além das privatizações. Para ele, o presidente tem de insistir na pauta para se diferenciar dos rivais e ganhar votos.

“Se a gente não privatiza, não vende, as pessoas vão pensar ‘em quem vamos votar, [se for] para ficar tudo parado, do jeito que era, estatal, tudo igualzinho como sempre foi?'”, disse Guedes no mês passado. “Temos de girar, temos de seguir nossa agenda”, afirmou o ministro.

Affonso Celso Pastore, economista do pré-candidato Sergio Moro (Podemos), afirma que as reformas são necessárias para cortar gastos e acelerar a atividade econômica. Ele cita especificamente a reforma tributária.

“A retomada do crescimento exige um amplo programa de reformas que incluem, entre outras, a tributação de bens e serviços e o Imposto de Renda”, afirma Pastore.

Em sua visão, a reforma deve eliminar distorções importantes —como a guerra fiscal entre os estados e a penalização às exportações de manufaturados por causa da incapacidade de recuperar créditos tributários.

“A reforma tributária mais importante é a que unifica todos os impostos sobre bens e serviços na forma proposta pela PEC [proposta de emenda à Constituição] 45, em tramitação na Câmara”, afirma.

Mauro Benevides, economista que assessora o pré-candidato Ciro Gomes (PDT), diz que a primeira reforma a ser buscada é a tributária.

Ele defende criar mais faixas no Imposto de Renda para tributar os mais ricos, medidas para evitar a pejotização, elevar a taxação sobre heranças e se voltar mais ao patrimônio —inclusive no exterior.

“Você acha justo um carro pagar IPVA e um avião ou um helicóptero não? Você tem de ter alteração no patrimônio”, afirma.

Além disso, ele quer cortar gastos com subsídios entre 10% e 15% —até mesmo revendo as regras da cesta básica. “Na cesta básica, tem queijo suíço e filé mignon, que são da classe rica”, diz

Benevides também defende uma reforma administrativa, para baixar salários de ingresso na carreira e prolongar a chegada até o topo. “[Hoje], na maioria das carreiras você já está no topo da carreira após 18 anos —de um total de exercício de 30, 40 anos”, diz.

Henrique Meirelles, assessor econômico do pré-candidato João Doria (PSDB), apresenta um programa liberal similar ao apresentado por Guedes na campanha de 2018.

Meirelles quer implementar as reformas administrativa e tributária, além de pregar desinvestimento de estatais, concessões de infraestrutura à iniciativa privada e a abertura gradual da economia.

“No estado de São Paulo, fizemos reforma administrativa e temos daqui até o final de 2022 R$ 50 bilhões em caixa para investir. Se fizer [no âmbito federal] uma reforma administrativa como aqui, onde fechamos cinco empresas estatais com corte de despesas, isso já gera efeitos no ano seguinte”, afirma.

Ministro da Fazenda no governo Temer, Meirelles foi responsável por uma reforma trabalhista no período e vê como possível implementar mais uma rodada de mudanças na área. “Pode, mais à frente, fazer alguma coisa na reforma trabalhista, sim”, diz.

Controversa no debate político brasileiro, a flexibilização da legislação trabalhista brasileira é defendida por entidades de diretrizes liberais como o Banco Mundial para facilitar a contratação e aumentar a produtividade.

Para Meirelles, a diferença de sua plataforma para a do atual governo será a capacidade de entrega. “Basta ter um governo que tenha disposição, a liderança e a decisão de fazer reforma como fizemos em São Paulo”, disse.

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