Justiça afasta tributação sobre valores de menores aprendizes

Valor Econômico –

Empresas têm obtido na Justiça o direito de reduzir a tributação sobre valores pagos a jovens aprendizes e menores assistidos. As decisões afastam o pagamento da contribuição previdenciária patronal, além das contribuições devidas a terceiros (Sistema S, Incra e salário-educação) e para os Riscos Ambientais do Trabalho (RAT) – usada para cobrir acidentes de trabalho.

Pelo menos uma liminar e uma sentença levam em consideração entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que não há relação de emprego entre empresas e menores assistidos (REsp 1599143). A decisão é de maio de 2016 e foi concedida pela desembargadora convocada Diva Malerbi, do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, com sede em São Paulo.

A tese é importante porque as empresas são obrigadas por lei a contratar menores aprendizes – jovens entre 14 e 24 anos. A cota é de 5% a 15% sobre o total de empregados, segundo o artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Esse contrato pode durar no máximo dois anos e o aprendiz tem assegurado o pagamento do salário mínimo hora.

Em geral, as companhias recolhem todas as contribuições previdenciárias sobre valores pagos a aprendizes. Com o uso do eSocial, os menores são incluídos, automaticamente, na conta geral de trabalhadores. A cota-parte patronal é de 20% ou 22,5%, o RAT vai de 0,5% a 6% e as devidas a terceiros ficam na casa dos 5,8%.

Contribuintes, porém, têm se mobilizado para ir à Justiça questionar esses recolhimentos e pedir de volta o que pago nos últimos cinco anos. Uma das liminares, do fim de março, beneficia uma fabricante de equipamentos de informática. Em janeiro, a Volkswagen conseguiu entendimento no mesmo sentido.

Segundo o advogado que assessora a empresa de informática, Marcel Cordeiro, sócio do Balera Berbel & Mitne Advogados, como a contratação de aprendiz é regida pela CLT, as empresas costumam equipará-la a um emprego normal e pagam as contribuições previdenciárias. Contudo, acrescenta, a própria CLT, no artigo 428, afirma que se trata de um contrato de trabalho especial, com prazo determinado.

Cordeiro lembra que o menor aprendiz não está elencado nem como segurado da Previdência Social nem como contribuinte – artigo 11 da Lei nº 8.213/1991 e artigo 12 da Lei nº 8.212/1991. “Tem uma dupla lacuna na legislação previdenciária”, diz.

A liminar que favorece a empresa de informática foi dada pelo juiz Diego Oliveira, da 9ª Vara Federal de Manaus (AM). Ele entendeu que “o fato gerador do tributo em comento é o pagamento de remuneração aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que prestem serviços à empresa, o que não se confunde com o contrato de aprendizagem regulado pelos artigos 428 e 429 da CLT” (processo nº 1005545-03.2022.4.01.3200).

O magistrado acrescenta que o artigo 428 da CLT dispõe que o contrato de aprendizagem está inserto em uma modalidade especial, “visando assegurar ao maior de 14 anos e menor de 24 anos uma formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico”.

O juiz ainda cita o julgamento do STJ que reconheceu o caráter não empregatício do contrato de aprendizagem e a não necessidade de recolhimento de contribuições previdenciárias sobre a remuneração destinada ao menor.

Esse mesmo precedente foi citado na decisão obtida pela Volkswagen. O juiz da 3ª Vara Federal de Santo André (SP), José Denilson Branco, excluiu da base de cálculo da contribuição previdenciária patronal e da contribuição para financiamento de benefícios decorrentes de riscos ambientais do trabalho, bem como das contribuições devidas a terceiras entidades, “os valores relacionados às remunerações pagas aos menores que lhe prestam serviços na condição especial de aprendizes”. Ainda reconhece o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente nos últimos cinco anos.

Além do precedente do STJ, o juiz fundamentou a decisão no artigo 4º do Decreto-lei nº 2.318, de 1986. O dispositivo prevê que, em relação aos gastos com os menores, “as empresas não estão sujeitas a encargos previdenciários de qualquer natureza” (processo nº 5004467-32.2021.4.03.6126).

De acordo com a advogada Tathiana Pedrosa, do escritório Rolim, Viotti, Goulart, Cardoso Advogados, as empresas têm começado a se mobilizar para discutir o tema na Justiça, uma vez que, ao cadastrar os menores aprendizes no eSocial, são obrigadas a enquadrá-los como empregados, por ausência de categoria específica para esse tipo de contratação, como ocorre com os estagiários. “Isso dificulta os empregadores a realizar qualquer medida administrativa, havendo a necessidade de ajuizar medida judicial para recuperar o seu direito”, afirma.

Por meio de nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) diz que, quando for intimada em relação à liminar da empresa de informática, analisará se vai recorrer. Quanto à decisão favorável à Volkswagen, afirma que já foi interposta apelação.

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